Wednesday, March 14, 2012

ciclo do amante substituível

existe gente como breno rotatori e david lynch que, despite as nao-faladas regras do mundo da arte, estao sempre inventando o que fazer, sempre ocupados com suas pesquisas e trazendo coisas novas, publicando esbocos e ideias em seus blogs, sem medo de correr riscos. enfim, existe gente que sabe entreter. gracias. ricardo domeneck, meu amigo e muso e escritor, é dessa laia também.

digo isso porque nao faz seis meses que ricardo lancou seu quarto livrinho (o diminuitivo é pelo tamanho físico da publicacao), cigarros na cama, e já nos (me) presenteia com o quinto, ciclo do amante substituível.

entenda, cara leitorinha, nao sou crítica literária. sequer sou exemplo de leitora: leio meia dúzia de livros por ano, metade de autores russos, os outros três sao de poesia indicados pelo próprio ricardo. entao nao vou saber dizer direito porque o dele é bom, nao vou citar filósofos nem nada, e espero que minhas balelas adolescentes nao diminuam a beleza desse livro.

o negócio com o ciclo comeca já com a capa, fotografada pelo maravilhoso heinz peter knes. o ciclo do título reaparece na foto, mas ela nao te dá em nada a sensacao fluida que a palavra tem, ao contrário. heinz, ao optar por fotografar na vertical, interrompeu a danca dos olhos por cima dessas pernas, que, ao menos para mim, funcionariam mais obviamente fotografadas na horizontal. assim, o ciclo do título, reproduzido na foto, fica atravessado na garganta e no dicionário. nao, essa foto nao é fluida, talvez porque esse amante nao seja em nada substituível e tenhamos que sobreviver a isso. queridinha.



ricardo entendeu, gracas a deus, que é um poeta que escreve poemas de amor, e ele mesmo admitiu  na página 154 ("toda antilirice desértica em mim sumiu quando as chuvas regulares da saliva deste despencaram em minha boca"). na verdade, ele aceita isso, mas também se pergunta coisas ("o papel do poeta seria mesmo o de emocionar mocoilas e consolar velhinhos?", pag. 125), e essa dualidade faz com que ele tanto nos ofereca momentos de profunda docura, como momentos em que a o que importa ali é a palavra, seu desenho e também seu som, que faz com que você simplesmente TENHA que ler o poema em voz alta. o livro de ricardo proporciona nao somente deleite amoroso, identificacao pessoal e risadinhas, como também desafio artístico e uma vivência física. como se ele te desse a chance de viver uma performance, com o o script já pronto.

mas para mim, claro, o que mais interessa sao os poeminhas de amor hahahaha. sao esses que fazem do ciclo um daqueles livros que você grifa trinta versos por poema, e pensa qual deles vai publicar no face, qual no twitter. pensa qual vai virar camisata, qual vai virar protesto, e qual será usada, quando a hora certa chegar. ou há passagens em que eu realmente quis ter escrito aquilo. alguns versos te dao o deleite de saber que o autor nao somente percebeu que a coisa aconteceu, mas conseguiu encontrar a palavra certa que a define, que a faz existir para sempre.

e aqui, querida leitora, um guia de algumas das minhas frases de efeito preferidas do ciclo, que publico pra vocês tipo esses guias que o pessoal usa no orkut, pra citar clarice lispector fingindo que leu seus livros, sem nunca ter sequer chegado perto de um:

"nao era exatamente um nirvana,
mas era um comeco".

"tudo o que eu queria era
um café como eu,
forte e barato" HAHAHAHA MUITO BOM!

"reivindica
tua mínima
catástrofe
pessoal"

"(...), estou sempre a meras horas
de distância da amorosa inanicao"

"se o futuro é uma folha em branco
certamente está amassada"

"agradeco-vos a oportunidade
de fazer do advérbio sim
uma interjeicao obscena"

mas o meu poema favorito é mesmo esse (com o perdao da violacao das cedilhas e dos tils, nao os tenho):

as importâncias da alta cultura
Nós estamos,
moco,
em marco
de 2011,
você tem 26
anos,
eu ainda 33,
e escutamos
a gravacao
de 1966
por Glenn Gould
aos 24
da Sonata
para piano
No. 8
em Dó menor,
op. 13,
que Beethoven
publicou
em 1799
quando tinha 28,
e você tagarela,
mistura sua voz
às notas,
e eu, ora, eu nao
imagino por que
outro
motivo Beethoven
a teria composto
e Gould
gravado-a, se nao
como fundo sonoro
para sua voz

(o poema é maior, mas o interrompo aqui porque eu morro com esses últimos versos, é a maior declaracao de amor da história do mundo mundial).

a quem interessar possa, ciclo do amante substituível custa R$ 39 (vale a pena cada centavo, sao 190 páginas de amor e uma foto feita por mim no final HAHAHAH) e dá para comprar no site da editora sete letras.

4 comments:

Jessica Moraes said...

escreve alguma coisinha agora, vá? mortinha de vontade de ler uma dúzia de palavras que ficam lindas juntas quando vem de você. vontade de ser sua amiga. beijins

. said...

Eu sou apaixonada por ele. Devoro tudo que se trata dele desde que descobri o blog. É tão bom ter algo assim neste plano, nesta dimensão. Indico aos meus amigos mais amados e mais profundos. Não indico a todos pq tenho essa mania imbecil de guardar o melhor pra quem merece. E que sou eu pra julgar? Ainda não comprei o Livro de Ricardo pq pedi de presente de aniversário. Não ganhei! Acho que a hora é essa! hahaha Beijoca!

Sebastião Ribeiro said...

é dum poeta como domeneck que se precisa nesta minha terra chamada Maranhão... vou ver o que posso fazer haha

Sebastião Ribeiro said...

ah, esqueci de falar... este post é provavelmente uma das melhores críticas de poesia ever, sério.